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Em Casa a Criança Também Aprende.
Dr. Jaime Zorzi
Publicado em 19-06-2018 00:00:00
As pessoas que convivem com a criança são, desde muito cedo, seus grandes mestres. Deste núcleo familiar inicial serão formados conhecimentos, desenvolvidas habilidades e até mesmo constituídas muitas características de personalidade. Desde muito cedo a criança aprende em casa e terá seus pais, irmãos ou outros cuidadores, como modelos de ser e de agir. A possibilidade de aprender coisas a respeito do mundo da escrita também é altamente dependente deste ambiente. Algumas crianças terão grandes oportunidades em razão de seus pais terem um nível mais elevado de educação e de uso ou envolvimento com a linguagem escrita. Outras, contrariamente, pouco ou nada poderão usufruir nesse sentido, tendo em vista o baixo grau de escolaridade de seus pais, ou o pouco envolvimento deles com atividades e usos relacionados à leitura e à escrita.
Em muitas famílias, os atos de ler e escrever estão tão presentes que fazem parte do dia a dia, como é o caso de comer, tomar banho, dormir, passear. Eles fazem parte da rotina. Embora não necessariamente seja verbalizada, a importância e o valor do ler e do escrever estão fortemente presentes na cultura, nos valores e nas atitudes de uma família com este perfil. Assim sendo, a criança sente, como que “no ar”, a importância de tal aprendizado e sua diversidade de usos e funções.
Neste contexto, a chance de que a criança venha a se “encantar” com esta forma de linguagem é muito grande, principalmente se os pais criam condições de envolvimento com este mundo, como acontece quando eles têm o hábito de ler para os filhos, de incentivar brincadeiras ou jogos de escrever, propiciando assim um faz de conta com o universo dos livros e das letras. Essa criança tenderá a ter um alto interesse por aprender a ler e a escrever, podendo chegar, a partir de situações diárias e informais de aprendizagem, a níveis adiantados de conhecimento da linguagem escrita. Muitas delas já chegam alfabetizadas na série em que o processo deveria formalmente iniciar.
Na direção oposta, quando os pais, a fim de motivar a criança, procuram justificar o quanto é importante aprender a ler e escrever “para ir bem na escola”, ou “para arranjar um bom emprego quando crescer”, para não ficar “burro” e outros argumentos do gênero significa que a descoberta do que é realmente a linguagem escrita, ainda não aconteceu. Para estas crianças, em geral, a escrita acabará tendo uma finalidade meramente acadêmica, principalmente se elas não tiverem a oportunidade de fazer novas descobertas de usos e funções da escrita, e nisso a escola terá um importante papel. Como já apontamos, as razões para tanto podem ser diversas: a baixa escolaridade dos familiares ou mesmo o pouco envolvimento que pais com níveis mais elevados de educação têm com a leitura e a escrita. Quem não apresenta um determinado comportamento, dificilmente poderá servir de modelo para que alguém possa vir a adquiri-lo.
Considerando-se a importância do ambiente familiar, estes fatos deveriam ser considerados pelos programas escolares de modo que eles pudessem contemplar uma atuação junto às famílias, orientando-as no sentido de criarem situações domésticas favoráveis para o aprendizado e uso da escrita, mesmo em famílias com pouca escolaridade. Nada impede, por exemplo, que em um ambiente não letrado, a criança que está aprendendo a ler e escrever torne-se a responsável por introduzir a escrita na casa, assumindo funções de fazer listas de compras, anotar recados, escrever cartas para os familiares e mesmo ler para os adultos.
Tivemos a oportunidade de conhecer uma senhora com vários filhos. Como ela mesma afirma, não teve condições para ser alfabetizada. Veio de uma família pobre, vivendo em região também muito pobre. Porém, ao “acompanhar” as lições de casa de seus filhos mais velhos, começou a aprender um pouco com eles. Neste caso, os filhos estavam alfabetizando a mãe. Esse conhecimento adquirido, por sua vez, ela passou a usar com os filhos mais novos, ajudando-os mais efetivamente nas tarefas de casa. Curiosamente, apesar de todas estas restrições, esta senhora compreendia muito bem o valor da escrita, e conseguia como que “contaminar” seus filhos com tal encantamento.
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